segunda-feira, 24 de julho de 2017



          O MENINO DE RUA


           Quando eu morava no Rio de Janeiro, em Copacabana, quase todas as manhãs gostava de fazer minhas caminhadas pelo calçadão da Avenida Atlântica. Era um vaivém de pessoas, quase se esbarrando umas contra as outras.
           Um dia, saí de casa mais cedo. Fazia um frio daqueles. Peguei um casaco velho e joguei-o sobre os ombros e iniciei o meu percurso costumeiro, desviando-me dos transeuntes e dos cocôs de cachorro.
            Andei uns dois quilômetros. Quando estava já perto da Praia do Leme, parei um pouquinho e vi deitado na areia um menino franzino, de pele escura. Vestia uma bermuda toda suja. Imundo também ele estava e sem camisa. Dormia profundamente.
            Aproximei-me dele. As pessoas transitavam pela calçada, sem sequer lançar um olhar sobre aquele ser humano ali jogado.
           Deu-me um aperto no peito e senti pena do garoto. Lembrei-me da minha sofrida infância. Morava na roça e trabalhava, de sol a sol, com meu pai.
          Não quis acordar a criança. Tirei meu casaco e, bem devagarzinho, coloquei-o sobre aquele corpo ali encolhidinho, certamente com muito frio. 
          O menino devia ter uns oito anos de idade. Talvez não tivesse pai nem mãe, nem ninguém para cuidar dele. Tinha comigo uma nota de cinquenta reais. Consegui enfiá-la no bolso interno do agasalho doado e me afastei. Continuei minha caminhada.
          No dia seguinte – era um sábado – não iria trabalhar. Fui dar uma volta pela linda Praia de Copacabana. E quem eu vi?  Aquele menino, vestido com o meu casaco e vendendo balas.
         Cheguei perto dele e comprei todas as balas e ainda lhe dei dez reais para ele comprar um lanche. Então, perguntei-lhe: “Você vende balas sempre por aqui? Mora onde?”
        Ele respondeu; “Meu pai está preso e minha mãe faleceu. Não tenho irmãos. Quando consigo um dinheirinho, compro balas para revender. E assim vou vivendo. Mas, ontem tive muita sorte: uma pessoa de Deus me deu esse casaco e deixou dentro dele cinquenta reais. Apanhei a grana, tomei um café reforçado. Com o resto, comprei estas balas. E agora o senhor está comprando todas. Deus lhe pague’”.
       Cabisbaixo, deixei o menino e segui andando. Mas, revoltado, gritei: “onde se esconde o pessoal dos Direitos Humanos?”  

       E pensei: “quantas crianças estão morando na rua, em condições infra-humanas, meu Deus!”.  Fechei o punho e dei um soco no ar.

Autor: Geraldo de Castro Pereira

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