O MENINO LEVADO DA BRECA
Joaquim, por todos chamado de “Quinzinho”,
era um menino franzino, com suas pernas cheias de perebas devido a picadas de
mosquitos. Piolhos fervilhavam em sua cabeça. Andava descalço, porque seus pais
não tinham condições de comprar para ele nem sequer um chinelo dos mais
baratos. Por isso, os chamados “bichos de pé” faziam a festa entre seus dedos
do pé.
O coitado nasceu e vivia num pequeno
sítio. Usava umas calças remendadas, que iam até o joelho, uma camiseta
desbotada e um chapeuzinho de palha.
Mas do que ele mais gostava era caçar
passarinhos. Fazia pelotas de barro e as queimava para servirem de projéteis
colocados em seu estilingue. Tinha uma pontaria daquelas.
Sua mãe lhe fizera uma capanga de pano
velho. Ele a enchia com as pelotas de barro e saía pelas matas. Voltava para
casa com mais de dez passarinhos abatidos pelo seu certeiro estilingue.
Ele mesmo depenava as avezinhas e as colocava
numa panela fervendo.Depois, pedia para sua mãe fritá-las numa grande
caçarola. E, sofregamente, devorava tudo com farinha de milho.
Apanhava também tanajuras e enfiava um palito
no traseiro delas para fazê-las girar e elas ficavam batendo as asinhas,
desesperadas, até morrerem.
Coitadinhas das cigarras. Amarrava
linhas no pescocinho delas para, presas, fazerem-nas voar, como se fossem
pequenas pipas. Morriam estranguladas pelas linhas cortantes.
De
noite, pegava uma vara de bambu e a sacudia para capturar morcegos; apanhava
vaga-lumes e os colocava dentro de um vidro com algodão para servirem de
pequenas lanternas.
De outra feita, com seu bodoque acertou
um beija-flor que avidamente sugava o néctar das flores da paineira exuberante
existente no meio de um pasto. Correu com o pássaro na mão, e, alegremente, foi
mostrá-lo à sua mãe. Levou uma tremenda represália. Ela lhe disse: ---“meu filho,
esta avezinha é de Nossa Senhora. Você não pode fazer-lhe mal”. Dona Filomena,
sua mãe, colocou a ave debaixo de uma bacia de alumínio e deu várias batidas
por cima. Ao levantar a bacia, a ave estava vivinha e saiu voando, ainda meio
tonta.
Numa bela manhã toda ensolarada, como seu pai
estava trabalhando no garimpo já fazia quase um mês, resolveu prender um
franguinho dentro de um pequeno armário. Quando seu pai chegou, Quinzinho correu
para tirar seu prisioneiro do armário. Qual não foi sua desilusão, ao verificar
que o penoso já estava morto e até fedendo. Ele se esqueceu de dar-lhe água e
comida e deixar uma fresta para o pobrezinho respirar.
Certa vez, quando sua mãe estava fazendo doce
de marmelo num grande tacho de cobre, o menino ficou ali por perto. De repente,
enfiou uma colher de pau no tacho para experimentar a guloseima. A colher caiu,
com o doce ainda fervendo, em cima de seu pé. Sem saber o que fazer com tanta
dor, mergulhou o pé numa bacia com água, deixando-o em carne viva. E, para
complicar a situação, seu pai aplicou um produto na ferida, próprio para tratar
aftosas de animais. A ferida agravou-se mais ainda e demorou quase um ano para
cicatrizar-se. Um dia, montando em um jumentinho,
foi levar comida para seu pai, que estava consertando uma estrada de carro de
boi cerca de uns cinco quilômetros do sítio. No caminho, do outro lado da cerca
de arame, viu um filhote de anum.
Sem demora, apeou-se do animal, largou
a marmita de comida no chão e avançou para cima do filhotinho para apanhá-lo.
Nem enxergou a cerca. Ficou todo arranhado pelo arame. Em razão do fato, a
comida chegou fria às mãos de seu papai. Levoi dele uma surra daquelas. E seu
pai lhe perguntou:
- “para que serve um filhote de anum,
uma ave que não canta bonito e se alimenta de vermes e carrapatos de animais?”
“Ah, pai, ele era tão bonitinho!
Meu vizinho cria até um urubu em sua casa.”
Só mesmo coisas de um menino levado da breca! Mas, que divertimentos
poderia ter uma criança vivendo numa roça?
Autor: Geraldo de Castro Pereira
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